Você está no comando de um Boeing 777-300ER em pane elétrica com 339 passageiros e 16 tripulantes. Inicia o diálogo com um operador do aeroporto de Confins, MG, o mais próximo em condições de receber um pouco de emergência de um aparelho do porte. A seguir analiso como um caso como esse pode oferecer lições de como gerenciar uma crise de comunicação.
O fato ocorreu esta semana, dia 20 de dezembro. O vôo TAM 8084 da companhia Latam Airlines Brasil decolou do aeroporto de Guarulhos, S. Paulo (GRU) em direção a Londres (aeroporto London-Heathrow LHR). Logo nos primeiros minutos ocorreram “problemas técnicos” que ocasionarem uma pane elétrica. Por sorte, o avião chegou com segurança no aeroporto de Confins, embora os pneus tenham se danificado durante o pouso.
Lição número 1: admita que você tem um problema
Em muitas crises a demora em admitir que há um problema faz com que o problema não só não desapareça como cresça em volume e repercussões. É fundamental que desenvolva uma mentalidade de urgência para todos os casos em que está claro que o problema não será resolvido por si só. O piloto admitiu imediatamente que havia um problema e que o mesmo poderia ter repercussões sérias.
Lição número 2: hierarquize
Há uma série de lendas na aviação civil: uma delas diz que um comandante do avião, que é a principal autoridade no ar, pode até casar pares apaixonados e ansiosos. Isso é uma lenda mas em qualquer crise na aviação, o comandante é o responsável final pela tomada de decisões, ainda que envolve um time de especialistas ao seu lado como o co-piloto, pilotos reservas, navegadores e técnicos. Também no mundo das corporações, é importante que haja uma liderança identificada. A pior coisa é a descoordenação de ações por falta de direcionamento.
Lição número 3: comunique!
Não basta apenas admitir, é importante comunicar. O protocolo da aviação civil é claro: o sistema de comunicação envolve uma série de regras e foi isso que se ouve no diálogo entre o comandante e controlador de vôo localizado na torre do aeroporto de Confins. É necessário informar tudo o que se sabe, todos os indícios, sinais e situações, ainda que não se tenha um diagnóstico preciso.
Lição número 4: reúna o máximo de informações objetivas
No diálogo é possível ouvir o comandante perguntando ao controlador o tamanho da pista e é informado que são 3.000 mil metros de pista mais um escape de 600 metros. Esta informação é suficiente para que seja estabelecido um plano – pousar o avião na pista.
Lição número 5: compartilhe seu plano
O plano tem de ser o mais claro possível. O comandante informa que 1) tenta eliminar (“alijar”) o máximo de combustível possível, dando voltas em torno do trajeto ao aeroporto, 2) que vai pousar na pista e 3) que está preocupado com o fato de que o avião está muito pesado porque não conseguiu alijar o combustível no volume necessário.
Lição número 6: coordene, gerencie
O comandante do Boeing solicita apoio de bombeiros porque sabe que a combinação do peso do avião com a velocidade necessária para frear poderá exercer muita pressão sobre os pneus, que podem explodir e iniciar um incêndio, o que de fato ocorreu.
Ouvi o áudio (aqui). É impressionante a maneira com que o comandante conduz a operação, de maneira amigável (“ok, amigão?”) e educada (“… por gentileza, deixe preparado o bombeiro” …). Veja abaixo parte da fala dele:
– Me providencie bombeiro, ok, amigão? Estamos com esse problema um pouco sério, ok?
– Nós estamos muito pesados. O sistema de alijamento não está funcionando também. Nós estamos praticamente sem nenhum sistema elétrico funcionando corretamente. Então, nós estamos com esse problema um pouco sério, ok? Então, por gentileza, deixe preparado o bombeiro. Estamos efetuando o procedimento, tentando alijar o máximo possível o peso da aeronave. Mas está difícil”.