A pesquisadora Tracy Clark do instituto de jornalismo Donald W. Reynolds, da Universidade de Missouri, investigou a questão das newsletters produzidas por jornais, em um artigo de junho de 2015.
Clark disse que uma pesquisa realizada pela IBM indicava que o percentual de abertura de e-mails pelos usuários era de 20,7% nos Estados Unidos e de 21% no mundo. No caso de e-mails enviados por empresas de publishing e mídia, a média nos EUA caia para 16,1%. As médias de “click-through” eram de 3% nos EUA e 3,2% globalmente. No setor de mídia e publicações, esses percentuais caem para 2,2% nos EUA e 2,8% no mundo.
Isso significa que para cada 100 pessoas que assinam uma newsletter de notícias e informações nos EUA, apenas 16 abrem esse e-mail todos os dias e apenas duas pessoas clicam em algum link dentro da newsletter.
Por outro lado, o estudo da IBM indicou que a taxa de cancelamento de assinaturas era mais baixa nas newsletters de mídia – 0,06% nos EUA e 0,13% no mundo. Os assinantes não abrem muitos e-mails, mas dificilmente deixam de assinar o conteúdo.
Clark se pergunta porque as empresas de mídia produzem newsletters se o engajamento é tão baixo. O principal motivo é que o e-mail diário é um modo fácil de registrar a presença da marca na mente do leitor (mesmo que eles nem abram o e-mail).
A pesquisadora diz que as empresas não podem se apoiar nas notificações enviadas para usuários móveis para acessar o aplicativo do site de notícias. Um estudo da Kahuna diz que 60% dos usuários cancelam as notificações móveis. Entre aqueles que aceitam receber notificações, a média de envolvimento é de 19% com os conteúdos jornalísticos. A cada 100 pessoas, apenas 40 recebem os alertas, e apenas 8 clicam para abrir o app.
Clark analisou as ofertas de newsletter de algumas publicações de renome nos EUA, como a revista Fortune e os sites Quartz, theSkimm, The Daily Beast e Vox Sentences.
Clark disse que a newsletter “CEO Daily” da Fortune funciona como um bom agregador de notícias relacionadas com economia e finanças, com links diretos para as matérias originais de outras publicações.
O “Quartz Daily Brief” é uma newsletter muito elogiada, com alta taxa de abertura de e-mail pelos assinantes. A publicação combina conteúdo do próprio site Quartz e links para conteúdos de terceiros. O template é fixo, e não faz uso de imagens.
A newsletters do theSkimm é distribuída logo pela manhã na costa leste dos EUA. A publicação é leve e com pitadas de humor, e incluía entre 20 a 40 links para matérias. Em 2014, o Wall Street Journal observou que 70% dos assinantes da newsletter eram mulheres, a maioria entre 18 e 33 anos. Clark, que é uma mulher na casa dos 30 anos, não achou o conteúdo ou layout atraentes.
As newsletters do “The Daily Beast” são muito populares. A newsletter Cheat Sheet tinha uma base de assinantes superior a 600.000 pessoas em 2015, com conteúdo curado de vários sites de relevância (The Post and Courier, The Associated Press, Deadline, The Hill, ESPN, Lloyd’s, BBC, The New York Times, Reuters e até a FIFA). A publicação também inclui um amplo conteúdo original. Clark comenta que a newsletter poderia oferecer mais opções de personalização: ela não é interessada em conteúdos esportivos da FIFA ou ESPN, mas gostaria de mais matérias da AP ou do New York Times.
A newsletter “Vox Sentences” agrega conteúdos de múltiplas fontes sobre um determinado tema, formando uma narrativa unificada. Com citações, trechos literais, anúncios e muitos links, a newsletter oferece um painel bem variado de informações.
Newsletters do New York Times atingem 14 milhões de leitores
O editor Chris Stanford gosta de chamar seu cargo de “concierge de notícias”. Todos os dias, às 6h da manhã, ele dispara uma das newsletters mais populares do New York Times, a “U.S. Morning Brief”, para 1,6 milhão de assinantes. A newsletter funciona como uma versão da primeira página do jornal e reúne as notícias mais importantes, além de conteúdos mais leves, em linguagem agradável e informal.
Os jornalistas Alexandra S. Levine e Jonathan Wolfe, que escrevem outra newsletter muito popular, a “New York Today”, se consideram amigos de seus leitores, chamando a atenção para as coisas mais interessantes que ocorrem na cidade de Nova York.
Os assinantes de newsletters do Times, que buscam um “concierge de notícias”, um amigo, um guia sobre a administração Trump ou um artigo bem humorado para começar o dia, já somam mais de 14 milhões de pessoas. O jornal produz 55 newsletters sobre tópicos que vão dos principais destaques da política e economia, comentários sobre temas sociais, culinária e muito mais. As newsletters podem ser um modo de dinamizar a cobertura jornalística e separar os temas de maior peso dos assuntos secundários.
O editor Stanford diz que vivemos em uma era de imenso volume de notícias, e o volume de conteúdo produzido diariamente é elevado demais, mesmo para uma equipe especializada em resumir e sintetizar os fatos. Segundo ele, os leitores apreciam o trabalho realizado por profissionais que selecionam e destacam o que é mais importante, para que o conteúdo relevante possa ser lido em curtos períodos de tempo.
Quando foram originalmente criadas, em 2001, as newsletters do Times eram geralmente cópias integrais dos textos publicados originalmente no jornal, enviadas por email para os leitores. O NY Times continua fazendo isso, mas hoje o jornal cria conteúdos exclusivos para esse formato, com repórteres e autores que têm um estilo e um tom distintos do jornalismo distribuído por outras plataformas. A newsletter “Race/Related”, que aborda questões raciais, recentemente publicou ensaios pessoais de autores discutindo se deveriam deixar Porto Rico, arrasado depois do furacão; a “New York Today” publica artigos originais de segunda a sexta-feira sobre a vida em Nova York (por exemplo, porque os nova-iorquinos gostam de vestir roupas escuras); “Climate Fwd:” apresenta tópicos relacionados com mudanças climáticas, em linguagem acessível para leigos.
Muitas da newsletters produzidas pelo Times não estão sujeitas ao ciclo diário de cobertura jornalística, permitindo que autores (e leitores) possam dispor de mais tempo e reflexão. O editor Sewell Chan, que contribui para a “Race/Related”, diz que os leitores buscam por textos mais densos e introspectivos. Chan recentemente escreveu um artigo sobre os 150 anos do “Memorial Day”, o feriado americano que homenageia os soldados mortos em combate.
Boa parte dos jornalistas que escrevem e editam as newsletters está focalizada em como essas publicações enviadas por email podem ser usadas para conquistar os leitores, de modo mais direto e menos formal. Os leitores podem pedir conselhos de moda para a equipe da newsletter “Open Thread”, ou fazer perguntas sobre aquecimento global para a “Climate Fwd:”. Em outros casos, os leitores podem se tornar personagens das pautas.
Na newsletter “Smarter Living”, o editor Tim Herrera costuma oferecer temas aos leitores, a partir de suas experiências pessoais com o assunto da publicação, encorajando os leitores a responder com ideias. Herrera diz que recebe muito feedback dos leitores, que mostram empatia pelos temas e pela própria newsletter. Depois de uma edição em fevereiro sobre o fracasso em cumprir as promessas de ano-novo, milhares de leitores responderam contando seus casos pessoais e como planejavam cumprir as metas prometidas. Esse feedback se tornou o tópico de uma nova edição da “Smarter Living”, para ajudar outros leitores a seguirem seus planos.
Elisabeth Goodridge, diretora editorial de newsletters do New York Times, diz que o retorno dos leitores é o patrimônio mais valioso. É o local onde o jornal pode criar uma relação pessoal com os leitores, e o Times respeita essa relação.
A receita do “molho secreto” das boas newsletters, diz Goodrigdge, é a seguinte: conheça seu público, empregue quem realmente entenda do assunto, crie um belo design, mantenha as melhores práticas jornalísticas e, acima de tudo, oferece algo de valor e interesse, que não possa ser encontrado em nenhum outro lugar.
Por outro lado, a newsletter é um ambiente íntimo e controlado, e o tom, imagens, periodicidade e assuntos não devem afugentar o público.
Andrea Kannapell, editora de briefings do New York Times, diz que as newsletters devem ser idealmente uma experiência “livre de atrito” (“friction-free”). Isso quer dizer, textos mais leves, tom conversacional, e informações ajudem os leitores a conversarem sobre as notícias no ambiente de trabalho ou em festas.
Kannapell diz que o objetivo é que o leitor se sinta melhor depois da leitura, e que o leitor considere o autor da newsletter como “aquele amigo na redação, que se preocupa em passar as informações mais necessárias na hora certa”.
Como a The Economist reformulou sua estratégia de newsletters
Em setembro de 2017, a revista The Economist criou uma equipe específica para revitalizar sua abordagem sobre newsletters. O objetivo era usar essas newsletters para aprofundar seu relacionamento com os leitores e convencê-los a se tornarem assinantes integrais da publicação.
Segundo Sunnie Huang, editora de newsletters da Economist, a publicação realizou mudanças significativas no design das newsletters, mas a maior mudança foi na mentalidade.
Huang disse que nos últimos doze meses, houve uma clara mudança no modo como a empresa gerenciava suas newsletters. Em vez de usá-las como “megafones” para distribuir o conteúdo jornalístico, a Economist começou um processo para transformá-las em produtos “stand-alone” que pudessem atender as necessidades dos leitores.
Atualmente, a revista oferece duas newsletters principais para todos os usuários registrados: “The Daily Dispatch” mantém os leitores em dia com análises atuais, enquanto “The Economist This Week” serve como guia para a edição semanal. A “Expresso” é um newsletter apenas para assinantes e é enviada de segunda a domingo, antecipando as notícias do dia.
Em entrevista para a WAN-IFRA, Huang conta que a equipe foi criada em setembro passado como parte de uma iniciativa editorial para aperfeiçoar os produtos digitais da empresa. A editora diz que o ponto de partida para mudar a estratégia das newsletters foi conversar com os leitores e descobrir seus interesses e frustrações.
Huang disse que a equipe reuniu pesquisadores, designers, desenvolvedores e editores para chegar às estratégias que podiam ser usadas para atender as necessidades dos leitores. A equipe investiu em design thinking, criando modelos e protótipos que foram testados com usuários reais, e modificados a partir do feedback desses leitores.
Ela explica que toda semana ocorrem experiências com as newsletters. Esses experimentos podem ser pequenos, como uma mudança no tamanho das imagens, ou significativos, como a transformação total de uma newsletter. A cada semana, a equipe aprende algo novo sobre sua audiência e pode refinar o trabalho.
Segundo a editora, o papel da newsletter é destacar a profundidade e o alcance do jornalismo da The Economist, encorajando os leitores a assinarem as publicações por email e atender as necessidades desses leitores.
Huang afirma que as redes sociais e sites de buscas ajudam a revista a apresentar seu conteúdo para um número maior de pessoas, mas as newsletters agem como um imã dentro desse funil, ajudando a revista a atingir e manter novos assinantes pagantes.
A editora disse que a equipe teve de lidar com problemas de formatação relacionados com o modelo antigo de email usado pela revista. Para poder cumprir seus objetivos, a equipe teve que começar do zero, criando novos templates para as newsletters.
Huang explicou que a maioria dos leitores assinam alguma newsletter ao se registrarem como usuários no site economist.com. E também há uma área para promover as assinaturas de newsletters no meio da página dos artigos.
A editora diz que agora a revista está promovendo esses produtos de modo mais ativo, explicando melhor o conteúdo de cada newsletter e o valor delas para os leitores.
Ela reconhece que a caixa de entrada de email é um espaço muito privado e cada vez mais lotado, e uma publicação deve brigar para provar aos leitores que vale a pena deixar que essas newsletters entrem em um espaço tão precioso.
Não importa quão relevante o produto seja, se os leitores não sabem o que estão assinando, eles não poderão obter o máximo valor do produto informativo, disse ela. A newsletter precisa criar interesse e expectativa muito antes do primeiro email chegar ao inbox do leitor.
Huang diz que a Economist usa o click-through como métrica da audiência das newsletters. Os números informam não apenas o tráfego gerado por esses produtos, mas também se os leitores estão aproveitando o conteúdo jornalístico. Porém, a editora diz que os dados não determinam as decisões da equipe. Eles ajudam a testar, modificar, lançar e melhorar os produtos, mas são combinados com pesquisas qualitativas com os usuários e com decisões editoriais, baseadas em experiência jornalística e instinto profissional.
** É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita. O Jornal 140 não se responsabiliza pela opinião dos autores deste coletivo.