O amor romântico – seja ele em forma líquida, confluente ou herdada do Trovadorismo – é um tema assíduo nas análises, contemplando desde questões de dores pós-término ou buscas de compreensão do desejo ambivalente de acabar uma relação. Ademais, é um paradoxo social o frequente descrédito dos sofrimentos amorosos, enquanto as paixões e seus encontros são vendidos como a validação das existências, incompletas até então.
Se as psicodinâmicas tratam de sujeitos em relação, cujas dinâmicas modalidades de sofrimento e subjetividades se localizam nos horizontes de suas épocas, é cara a compreensão de que as mesmas se encontram em estruturas machistas, classistas, racistas e heteronormativas. Ilustrações desse ponto são as depreciações das relações LGBTs, o peso sob as mulheres que escolheram não casar e a coibição dos homens a demonstrações de sentimentos. Também é essencial pontuar que, apesar de cada casal entender a felicidade conjugal de singular forma, o que esbarra na lei (como por exemplo violência contra a mulher) significa fim de relativismos.
Nesse contexto, infere-se que algumas experiências de separação agem como forças sociais que afetam outros âmbitos, objetivos ou imaginários, como o rompimento de um ideal maior ou abandono de um modelo de vida.
Enfim, apesar dos alicerces coletivos e das projeções e máscaras particulares, o que resulta em todo caso é a inevitabilidade de lidar com a falta, seja do outro ou do preenchimento do lugar que este ocupava. E da ausência, há um luto – com função, lugar e tempo. Simplesmente colmatá-lo não significa ser bem-sucedido sob as angústias e incompletudes do ser. Na abordagem psicanalítica, o luto por um fim de relacionamento é descrito por Caruso como “morte em vida: o outro morre em vida, morre dentro de mim”. Ademais, há outra dor, especialmente narcísica: a do próprio exício na realidade do próximo, muitas vezes assistida. Assim, com essas desorganizações no ego e abalos na identidade, agem os mecanismos de defesa a males psíquicos (como a depressão). Estes escudos se mostram como agressividade – que simultaneamente permite desidentificação e união com o objeto -, indiferença e fuga para adiante. Por mais, em uma perspectiva Lacaniana, podemos descrever um processo gerador de sofrimento que consiste de forma concomitante em desinvestimento e superinvestimento: esvaziamento do Eu, com concentração de força na representação psíquica do amado perdido com a intenção de manter viva sua imagem mental.
Entretanto são processos; existem outros repletos de ressignificados, novamente com função, lugar e tempo. Um deles é a separação interna, que implica em desinvestir na relação perdida e investir no próprio eu. Essa fase consiste em recolhas de projeções e expectativas, percepções de aspectos positivos e negativos da relação, diferenciação do que é duradouro do transitório, entendimento de que é possível a reorganização sem desmantelamentos e a descoberta de novos interesses e afetos.
Dessa forma, percebe-se que as separações são complexidades cheias de contradições, que impactam os sujeitos e o que os orbita. Mas por fim, fica compreensão de que houve rompimento de um projeto amoroso, porém não de O amor.
Sugestões de leitura:
Amor & Separação – Reencontro com a Alma Feminina – Silvana Parisi (professora doutora cuja às aulas de seu curso “A Dimensão Amorosa – Um Enfoque Junguiano” tive a honra de comparecer.
A separação dos amantes: uma fenomenologia da morte – Igor Caruso
** É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita. O Jornal 140 não se responsabiliza pela opinião dos autores deste coletivo.