Eberval Gardelha Figueiredo Jr. é graduando de direito e youtuber no canal Ebervalius Ahau. Há anos cultiva interesses diversos, como por antropologia, história, disciplinas de biológicas e filosofia – este último guiou nossa conversa.
Seu entusiasmo pelo campo é antigo. É possível dizer que ele sempre possuiu uma “inclinação filosófica”, o que supõe que seja compartilhado com a maioria das pessoas, ainda que fatores ambientais contribuam a manter o de algumas latente. Seu primeiro contato aprofundado com ela foi na escola, no nono ano, época em que a filosofia se torna matéria obrigatória no país. Neste período, leu os pré-socráticos:
“Na nossa tradição historiográfica da filosofia, os pré-socráticos são tidos como os primeiros filósofos. Me encantei logo com eles. Mas é uma filosofia muito incipiente, de lá pra cá muita coisa se desenvolveu. Eu sempre gostei muito de metafisica – ramo preocupado com a causa primeira das coisas, com a natureza mais fundamental da existência. Tenho a ideia de que todos os braços de um sistema filo são uma derivação da metafisica desse sistema. E como os pré-socráticos tratam muito de metafisica…
Atualmente, sua libido aponta para outras direções?
“Gosto do que o Deleuze chama de “pensamento menor” – de formas da filosofia que fogem do consenso, da jurisprudência majoritária. Gosto desse tipo de filósofo que ninguém conhece, são os mais diferentes, com maior potencial de mudar as coisas, nem que seja sua maneira de pensar.”
Assim, eis um nome favorito?
“Max Stirner, um dos grandes rivais intelectuais do Marx. Na verdade, Marx era mais dele do que o contrário. O que Marx escreveu xingando Stirner é mais extenso do que a obra inteira dele. Existe uma aura de mistério ao redor de sua figura, uma vez falecido antes da fotografia, sem nunca ter seu quadro pintado por não ser alguém importante. O que há de representação dele é uma caricatura desenhada pelo Engels. Gosto dele pela mitologia e pelas ideias. Dessas, há as da metaética, campo que estuda teorias éticas – o que você deve ou não fazer. Esta, acima disso, vê sua natureza, o que determina o que você deve ou não fazer. Sua teoria é a de anti-realismo moral, em que afirma não existir moral objetiva. Muitos partem desse pressuposto, mas poucos o levam até as últimas consequências.”
Quais as definições plausíveis de filosofia?
“A pergunta “o que é filosofia” não tem uma única resposta. Por exemplo, Kant a liga aos fins imanentes à razão. Deleuze a define como a arte da criação de conceitos – como ilustração, o autor fala que conceito é como tijolo, pode tanto ser usado para construir um tribunal da razão quanto para quebrar uma janela. Essa definição é interessante, a explicação é ambivalente. Se por um lado, você pode criar conceitos de forma desinteressada, por outro pode criar uma teoria metafisica completamente contra-intuitiva porque ela tem um certo valor estético. A filosofia se difere de outras ciências, não está sujeita ao mesmo paradigma, não tem regras absolutas. Por exemplo, alguns autores, como Heráclito, valorizam a intuição em vez do pensamento rigoroso. Já os filósofos analíticos pretendem que ela siga uma estrutura de lógica formal. Já os filósofos analíticos pretendem que ela siga uma estrutura de lógica formal. Então, por exemplo, dizem que a filosofia continental se assemelha a literatura e que seus autores não provam o que dizem.”
Discorrendo a respeito dessas diferenças não serem deméritos, a filosofia encontra alguma verdade?
“Depende da proposta de cada autor. A pretensão de encontrar verdades é comum na filosofia antiga, escolas socráticas vão neste sentido. Novamente, não é absoluto. Há, por exemplo, os céticos, que falam da impossibilidade ontológica de encontrar a verdade sobre qualquer coisa.”
Assim, quais seriam suas possíveis contribuições para a sociedade e momento atual que vivemos?
“Um dos potenciais da filosofia é traçar linhas de fuga. Ela ajuda você a enxergar um paradigma alternativo que te faz pensar que as coisas não precisam ser como são. No âmbito pessoal, ela pode tanto abrir seus olhos para adquirir alternativas como fortalecer seu próprio paradigma. Independente do que acontecer, você se tornará uma pessoa mais informada, conhecedora do mundo e sofisticada em sua maneira de pensar. Em outros campos, por exemplo, no direito, a orientação filosófica do jurista exerce influência tremenda. Um juiz kantiano vai seguir uma linha inflexível do que ele consideraria um direito natural, uma moral que deve ser seguida. Já um juiz positivista terá uma posição legalista, alegando que, se a lei diz, está certa e deve ser seguida. Direito e política são áreas que andam juntas. Se houvesse maior rigor conceitual nos termos de filosofia, o clima político de lugares como o Brasil seria bem diferente.
Por fim, seria verossímil pensar em um mundo sem filosofia?
“O mais próximo de um mundo sem filosofia é um mundo em que há só um paradigma filosófico, que todos seguem e os demais seriam impossíveis. Mas por mais que seja apenas um paradigma, ele estaria lá. Dizer que não há filosofia seria como não acreditar na evolução. Você está participando dela, mesmo que não saiba.
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