A velhice é instigante. Suas representações sociais são plurais, contendo as consequências belas ou dolorosas do passar do tempo.
A literatura, por possibilitar visões sobre o ser humano tanto em sua singularidade quanto nas suas relações, é um recurso para aprender sobre esta fase de vida. Assim, seguem 10 indicações de obras literárias, de diferentes gêneros e lugares do mundo, que têm a terceira idade como principal tema.
Leite Derramado – Chico Buarque
É o quarto romance do músico, dramaturgo e escritor vencedor do último Prêmio Camões.
A obra é composta por monólogos de Eulálio Montenegro D’Assumpção, um centenário hospitalizado, à beira da morte. Em suas falas, que não seguem a ordem cronológica, além de traçar um panorama na vida no Brasil no último século, revelam seu estilo de vida, suas escolhas, seus amores e sua decadência.
Assim, o livro é um apanhado sobre uma vida e tudo o que pode ser por ela envolvido. Nele, são caras as percepções de contingências comuns a quem está ciente de seu fim eminente.
Velhos são os Outros – Andréa Pachá
O livro reúne crônicas baseadas nas experiências da escritora e juíza na Vara de Sucessões.
Sob o olhar sensível e empático da autora, histórias reais de idosos que passaram pela Justiça são imortalizadas em comédias e dramas. As narrativas orbitam amor, dor, sacrifício e luto, retratando episódios do cotidiano de personagens diversos, que têm em comum a extensa experiência de vida.
Vó – Jean Galvão
O autor é desenhista, chargista, cartunista e membro da Sociedade dos Ilustradores do Brasil.
O livro reúne tirinhas em que a protagonista é a Vó: uma senhora solitária, saudosa, religiosa e divertida.
Ler a obra, além de resultar em risos e identificações, facilmente proporciona maior visão sobre o cotidiano de uma idosa e suas demandas.
O Diário de uma Boa Vizinha – Doris Lessing
É uma das obras que a escritora laureada com o Nobel publicou com seu pseudônimo, Jane Somers.
O livro relata a história (ficticiamente) autobiográfica da jornalista Jane, que se aproxima da solitária senhora Madie Fowler e constrói uma relação de amizade e troca de experiências, na qual é interessante contatar o que em cada uma mobiliza.
A narrativa, que tem a temática da velhice como a mais impactante, externa as delicadezas da escuta e do cuidado.
Assombrações – Domenico Starnone
O autor é um dos escritores italianos mais lidos da atualidade.
Neste romance, narra a ida do ilustrador Daniele Malarico à sua casa de infância e atual morada de sua filha, com intenção de cuidar de seu neto, Mario, enquanto ela viaja.
A convivência entre o senhor e o menino é um contraste etário que muitas vezes resultou em grandes perturbações. Tendo como pano de fundo um momento conturbado da carreira do protagonista e as reflexões consequentemente suscitadas, a construção da relação entre os parentes é um rico retrato sobre relacionamentos familiares, intimidade, limites pessoais, infância e velhice.
A Máquina de Fazer Espanhóis – Valter Hugo Mãe
É o quarto romance de Valter Hugo Mãe, um dos maiores nomes da literatura contemporânea. Sua edição brasileira é prefaciada por Caetano Veloso.
A história tem início quando o senhor Silva é noticiado da morte de sua esposa, com quem viveu por quase cinquenta anos. Pouco depois, institucionaliza-se em um lar para idosos, palco de amizades e panoramas de seu passado, onde percebe que, mesmo com 84 anos, ainda possuía fatos inéditos para viver.
Assim, tendo como pano de fundo a conjuntura política portuguesa, desafiando a linguagem em uma escrita sem letras maiúsculas e travessões, com o lirismo só por ele alcançável, o autor escreve sobre amor, luto, velhice e as diversas tomadas de decisões necessárias em vida.
Carta a D. – História de um Amor – André Gorz
A obra do filósofo francês é uma declaração a sua esposa, Dorine, com quem compartilhou quase sessenta anos.
Nela, o autor memora a trajetória de sua vida com a amada, desde o dia em que se conheceram até o momento em que optaram por viverem afastados de Paris e de todos. Em vários momentos, afirma o amor pela esposa, alega que sem ela não teria realizado muitos de seus feitos e declara que em nenhum de seus escritos anteriores fez jus à relação que construíram.
Assim, mais que um registro, o escrito é um acerto de contas com a existência. Ele externa as vicissitudes do desenvolvimento e situações possíveis na sua última etapa, a velhice.
Gratidão – Oliver Sacks
O livro é um compilado dos quatro últimos ensaios do neurologista e escritor, redigidos nos dias após a notícia de que, devido ao câncer, possuiria, aproximadamente, 18 meses de vida.
Seus textos são delicadas reflexões sobre o que passou e a forma de como gostaria de viver seus seguintes dias.
Assim, além de emocionantes considerações sobre o prazo vital e o envelhecer, são apanhados sobre a vida e as possíveis maneiras de encará-la.
A Casa das Belas Adormecidas – Yasunari Kawabata
O gigante escritor japonês laureado com um Nobel dispensa apresentações.
Na obra ambientada no Japão pós segunda guerra, o autor dá vida ao velho Eguchi, um senhor de 67 anos que, por indicação de um amigo, começa a frequentar uma casa em que os clientes dormem ao lado de moças sedadas. Confrontado com a juventude das mulheres, o protagonista lembra de seu passado e reflete sobre memória, nostalgia e proximidade do fim de sua vida.
No mais, o erotismo é um tema persistente na narrativa, de forma que são circunscritas considerações sobre a sexualidade e suas dinâmicas de poder e a sensualidade e sua (não) suposição na terceira idade.
Diário de um Velho Louco – Jun’ichiro Tanizaki
O autor tem um dos maiores nomes da literatura japonesa moderna.
A obra é composta na forma de diário do rebelde patriarca da família Utsugi, de 77 anos. Sua rotina regrada sofre quebras conforme encanta-se por sua nora, uma ex dançarina de casas noturnas que manipula o senhor em prol de seus interesses pessoais.
Além de ser interessante observar a dinâmica de poder construída entre os personagens, é extremamente rico perceber a vitalidade com que o protagonista se entrega aos prazeres hedonistas, desejos erroneamente considerados incomuns em pessoas de sua faixa etária.
Foto: Nathana Rebouças / Jornal 140
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