Há cerca de apenas dez anos quando se falava em espanholização do futebol brasileiro não faltavam comentaristas esportivos para rir e comentar: “Calma! No Brasil isso é impossível, são muitos clubes grandes e tradicionalíssimos! No início do Brasileirão sempre tem pelo menos dez candidatos ao título!”. E então iniciavam-se as citações às conquistas de times de menor expressão, em geral em torneios no formato mata-mata, como nas Copas do Brasil conquistadas por Juventude, Santo André e Paulista de Jundiaí.
Pois bem, em 2020 esta previsão se encontra próxima de consolidação. A diferença da receita do poderoso Flamengo para os demais clubes é extraordinariamente alta. Considerando apenas seus rivais do Rio, grotesca. E o Palmeiras, clube que chega mais próximo, o faz quase que exclusivamente por conta de um patrocinador daqueles que não aparecem todos os dias.
França e Alemanha despontam como exemplos de campeonatos sem competitividade
No que toca a esta questão, cabe inclusive questionar o termo “espanholização”. Afinal, na Espanha sempre tivemos dois clubes competindo entre si títulos, os gigantes Barcelona e Real Madrid, mas em decorrência de excelentes gestões hoje o Atlético sempre chega para disputar de igual para igual. Sendo assim, me pergunto se não seria o caso de considerar a Alemanha ou a França como exemplos mais condizentes do que pode vir a acontecer no futebol nacional.
Bayern Munchen e PSG simplesmente não tem rivais em seus campeonatos nacionais. O Bayern vem de 8 títulos seguidos, e se utiliza de um método de contratação que não é muito saudável a competitividade nacional. Basicamente todos os outros clubes, inclusive o que oferece maior resistência nas derrotas, o Borussia Dortmund, acabam servindo como reveladores de talentos para o rival maior e mais rico. Já o PSG, com fortuna árabe nos cofres, simplesmente contrata estrelas já consolidadas.
Um pós-Jesus instável
Aqui, haverão aqueles que questionarão: “Ora, mas o Flamengo teve apenas um ano de títulos, é muito cedo para falar disso! Além disso, estão tomando sufoco no Brasileirão!”.
De fato, mas depois de um sucesso estrondoso como foi a vinda de Jorge Jesus ao Brasil é absolutamente natural que o time se perca após sua saída. A adaptação a um comandante diferente, seja ele qual for, acabará acontecendo. E por mais méritos que tenha tido o português (e tem todos), o fato é que o material humano que lhe foi dado poderia ter rendido o Brasileiro nas mãos de basicamente qualquer técnico. E quanto ao “sufoco” que vem tomando o Flamengo, esperemos o final do campeonato (no qual o Flamengo já está bem posicionado)!
Assim, olhando para a discrepância financeira e o efeito bola de neve que pode ser gerado pelas conquistas o cenário é de fato preocupante: melhores jogadores conquistam mais títulos, mais títulos geram dinheiro e visibilidade, dinheiro e visibilidade rendem jogadores ainda melhores, e assim sucessivamente. Hoje o time B do Flamengo rivaliza com qualquer dos outros clubes mais fortes do país (e há quem diga que é melhor que todos eles).
Em turbulento clássico com o Palmeiras, com intensa atividade judicial, em virtude do surto de COVID-19 em seu elenco, o Flamengo se viu obrigado a ter um time de meninos completado por Thiago Maia, Gerson, Arrascaeta e Pedro. Com o resultado final, não faltou na mídia os merecidos aplausos a brilhante atuação desses jovens, como não poderia deixar de ser. Porém os rivais cariocas do clube, Vasco, Fluminense e Botafogo, utilizam times de meninos como titulares há tantos anos que hoje a isso sequer é dada atenção.
Soluções precisam ser encontradas
O Flamengo é culpado dessa situação? Evidente que não, está mais do que certo em colher destes frutos. Mas no que toca a continuidade do mágico futebol brasileiro dos 12 (e muitos mais!) clubes grandes, soluções tem que ser encontradas. Pois se mantida esta postura inerte dentro de poucos anos não haverá mais competição em âmbito nacional.