Em 2015 a Google realizou um estudo com mais de 180 equipes internas para entender os fatores que determinam o sucesso maior ou menor de uma equipe. Intitulado de Project Aristotle, o projeto realizado pelo Google’s People Operation (RH) investigou mais de 250 atributose o de maior relevância para um alto desempenho das equipes foi a segurança psicológica, independente do tipo de personalidade, das competências técnicas ou do background das pessoas.
Além de mostrar a relação direta entre segurança psicológica e bem-estar, engajamento, criatividade e retenção de talentos, o estudo mostrou que os resultados financeiros também são impactados: as equipes de vendas que não apresentavam esse problema excediam em 17% a meta, enquanto que as psicologicamente inseguras mostravam um desempenho 19% menor que a meta.
OK. Mas o que é segurança psicológica no trabalho?
O termo é usado desde 1990 quando o psicólogo William Kahn cunhou a expressão, mas ganhou relevância a partir dos estudos e pesquisas da psicóloga Amy Edmondson, mestre, PhD e professora de gestão e liderança em Harvard. Para ela, Segurança Psicológica é a
crença compartilhada entre os membros de uma equipe de que o ambiente é seguro para assumir riscos nas relações interpessoais
Em outras palavras, ninguém gosta de fazer papel de bobo, ignorante, ser julgado pelo que sabe ou não, expor fraquezas… o que, aliás, não é tão incomum assim no ambiente de trabalho. O que acontece é que por não sentir segurança em mostrar-se, as pessoas tendem a proteger-se com atitudes que acabam por atrapalhar a performance, não só sua, mas da equipe. Comportamentos como ficar calada, mostrar sarcasmo, fingir, evitar, culpar ou julgar os outros, dar desculpas, evitar conversas, acabam interferindo no ambiente.
Para Kahn, “a segurança psicológica permite que as pessoas possam se engajar e se expressar, ao invés de ficarem só se defendendo e dando desculpas”.
Uma observação interessante feita por uma das responsáveis pela pesquisa da Google, Julia Rozovsky, foi a de que o que mais importava não era quem estava na equipe, mas como seus membros se relacionavam e exploravam a inteligência coletiva – mostrando claramente que a inteligência coletiva é, sem sombra de dúvidas, superior à inteligência individual.
Como criar um ambiente seguro
Pesquisa do Instituto Gallup em 2017 mostrou que em cada 10 colaboradores apenas 3 acreditavam que suas opiniões eram importantes no trabalho. Cruzando dados, a pesquisa mostrou que ao melhorar esse índice as empresas poderiam aumentar a produtividade em 12%, reduzir a rotatividade em 25% e os incidentes do trabalho em 40%.
Estamos, portanto, falando de bem-estar, humanização e, sim, resultados – a maneira como o colaborador se sente reflete na entrega que faz. De acordo com a pesquisa de Amy,
“a segurança psicológica prevê melhorias na qualidade, comportamento de aprendizagem e produtividade”.
Em um momento como o que estamos vivendo, com todas as mudanças geradas pela Covid19, as empresas precisam, mais que nunca, que os conhecimentos de seus membros sejam compartilhados, discutidos e testados para poder contar com soluções criativas e inovadoras. Mas é preciso criar um ambiente seguro para que isso aconteça – um ambiente onde seja possível compartilhar ideias sem medo, expor preocupações, alterar caminhos, mudar decisões, colaborar e aceitar erros.
Mais importante, sem medo de retaliações, zombarias, julgamentos e imagem prejudicada.
Aspectos da segurança psicológica
De acordo com os estudos de Amy Edmondson, a segurança psicológica é alcançada quando, no dia-a-dia de uma organização os colaboradores sentem:
1. Segurança em se Expressar – as pessoas sabem que podem dizer o que pensam acerca do trabalho, expor problemas, colocar suas ideias e até questionar sobre o que está acontecendo, sem que sejam julgadas ou punidas por isso.
2. Segurança em Interagir – as pessoas sentem que podem dar e receber feedbacks, criar interação com seus colegas, pedir ajuda se precisarem, manter conversas e diálogos, mesmo quando são difíceis.
3. Segurança em Aprender – sendo o processo de aprendizagem diferente para cada um, é preciso que as pessoas sintam segurança em fazer perguntas, dar sugestões, arriscar opiniões e até aprender com erros.
4. Segurança em Pertencer – a necessidade de fazer parte é inata no ser humano e isso inclui ser apoiado e valorizado, tendo a segurança de que não será deliberadamente prejudicado ou rejeitado, independente de suas características pessoais.
É evidente que um ambiente seguro não se cria sozinho: é preciso que haja o conhecimento, a intenção e a ação. Uma boa maneira de começar é testando os membros da equipe com um questionário de levantamento da Segurança psicológica criado por Amy Edmondson. E que seja anônimo.
O que o líder pode fazer para começar
Sem sombra de dúvida, além da cultura organizacional, o que um líder faz ou deixa de fazer diante de sua equipe é o que vai definir a qualidade do ambiente.
Em primeiro lugar é importante relembrar que a convivência é diária e as relações são criadas a partir dessa rotina. E aqui entram os diferenciais comportamentais de cada líder, capaz de criar o local de trabalho saudável, seguro, produtivo e motivador. Parece muito?
São várias as soft skills e os processos que podem ser desenvolvidos por um líder para criar um ambiente de segurança psicológica no trabalho. Na verdade, assunto para outro post! Mas, para começar, deixo aqui os três principais comportamentos citados por Amy, que podem provocar um grande impacto:
1. Escuta ativa – entregue-se às conversas, demonstre entendimento, mantenha-se presente e focado no que as pessoas estão falando. Está na moda falar em Escuta Ativa, mas é preciso aprender a silenciar a mente.
2. Ser inclusivo ao tomar decisões – pedir opiniões, feedbacks e ter transparência máxima, na medida do possível ao explicar os motivos das decisões tomadas.
3. Ser inclusivo nas questões interpessoais – saber expressar ou demonstrar gratidão pelas contribuições, estar disponível para conversas e, em especial, não permitir fofocas e comentários depreciativos (esclareça logo).
Não são poucos os relatos nas redes sociais – e também nas minhas sessões de coaching – de pessoas que estão sofrendo nas empresas, através das lideranças, com a pressão decorrente da pandemia. A questão é que sempre existiu – apenas ficou mais clara e transparente agora. Tanto que a saúde mental dos colaboradores entrou definitivamente na pauta das organizações. Criar um clima de Segurança Psicológica é, portanto, vital para diminuir os custos e aumentar a performance.
Vamos falar mais sobre o assunto no próximo post.
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