Sabe-se que o narrar é organizativo, que o nomear localiza abstratividades e o compartilhar cria reconhecimentos. Tais atividades são fecundas, por exemplo, em processos de luto. Neste contexto, a escrita proporciona especiais elaborações.
Por vezes, ela é uma catarse. Do grego catharsis (purgação), a palavra denota a descarga de afetos que um ato proporciona.
Também há a criação sublimatória. “Sublimação” é o processo químico que faz passar um corpo passar do estado sólido ao gasoso. O termo também remete a “sublime”, adjetivo utilizado no domínio das belas-artes. Estas imagens estão contidas no conceito em psicanálise, contemplando a derivação de pulsões para objetivo artístico ou intelectual.
Assim, as presentes sugestões de leitura são feitas de dores. Consumi-las é conhecer histórias e sentimentos, que se não promoverem identificações, tornarão mais maduras as posições quanto à morte e ao que a envolve.
Morreste-me – José Luís Peixoto
José Luís Peixoto é um grande nome da literatura lusitana contemporânea. Este livro, poético desde o título, é o primeiro de sua carreira.
Ele resultou de um processo de luto. O autor começou a escrevê-lo aos 21 anos, três meses após a morte de seu pai. Segundo ele, foi com dificuldade que proseou poucas frases por dia até perceber estar diante de um livro que gostaria de publicar.
Assim, eis uma obra demasiadamente delicada, que não possui censuras para falar da morte, dos últimos dias e dos primeiros depois. Imergir nela é contatar impiedosamente o que a ronda: dor, impotência, memória e saudade.
A Invenção da Solidão – Paul Auster
Paul Auster é um dos mais destacados escritores da literatura norte-americana contemporânea. Este livro, que reúne duas produções distintas e complementares, é uma resposta à repentina morte de seu pai.
Poucos dias após ser noticiado do ocorrido, ele soube que escreveria sobre sua perda. Conforme relata, fazê-lo foi como meditar, culminando em registro, elaboração e evitação de que quem se foi desaparecesse.
O resultado é uma obra que, com mesclas de memória, ensaio e ficção, entrelaça referências artísticas ao real de uma vida. Logo, a investigação do autor sobre a história do pai e o relacionamento que construíram é transformada em uma prosa pessoal, honesta e mobilizadora de afetos diversos.
O Pai da Menina Morta – Tiago Ferro
É o primeiro romance do escritor e editor paulista, pelo qual foi laureado com um Jabuti. Ele o escreveu depois da tragédia que viveu em 2016: a morte de sua filha de oito anos em decorrência da Influenza B.
Na época, o autor, sem querer saber de experiências alheias, não leu sobre a morte. Mas na escrita encontrou uma forma de reconectar-se ao mundo. Sua primeira intenção foi construir um diário. Porém, viu sua prosa se decompor em outras formas narrativas, construindo assim uma autoficção composta por seções, que constituem uma espécie de caleidoscópio.
Sua leitura, portanto, é uma imersão no que preencheu o vazio decorrente de um luto inesperado.