A frase acima é de Alvin Toffler, um dos mais conhecidos – tanto admirado, quanto criticado – futuristas, uma profissão comum na atualidade, das pessoas que, analisando tendências, invenções, comportamentos e pequenas mudanças, são capazes de apontar grandes transformações no futuro, possibilitando o planejamento através de cenários. O detalhe é que ele fazia isso na década de 60.
Para quem nunca ouviu falar, seu primeiro livro, publicado em 1970, O choque do futuro, a partir de um artigo escrito nos anos 60, fez um grande sucesso e atraiu elogios pela sua grande capacidade de observação e síntese. Ao lado de sua mulher, ele previu mudanças como a reunificação da Alemanha, o fim da União Soviética, o fortalecimento da Ásia, entre outras, além da TV a cabo, gravação de vídeos, realidade virtual. Predição? Não. Observação e análise.
“O choque do futuro é a absoluta desorientação trazida pela chegada prematura do futuro… é um produto de ritmo grandemente acelerado das mudanças da sociedade.” Toffler
Visionário, na década seguinte ele lançou A Terceira Onda, analisando as grande mudanças e revoluções da história da humanidade e o que elas traziam em si em vários setores – a primeira onda foi a evolução para a agricultura; a segunda, a revolução industrial que transformou todos os setores da sociedade; e a terceira, desenvolvida no livro, a grande revolução que viria com a era da informação, a partir dos anos 50, que ele chamou de “economia da informação”.
Óbvio, você diria! Sim, só que ele escreveu sobre o assunto quando o uso da tecnologia como informação ainda era de uso restrito a algumas classes como cientistas e militares. Toffler previu os bate-papos digitais, e-mails, mídia interativa, o terrorismo eletrônico, o aumento da alienação social e do uso de drogas, entre muitos outros temas. Vale conferir a história: sua obra está sendo revista e talvez ele ainda venha a ocupar um lugar de destaque.
A quarta onda
Em 1993, Herman Maynard e Susan Mehrtens, retomaram o assunto a partir das visões de Toffler, e desenvolveram ‘uma visão do futuro a partir do futuro’, como dizem, ampliando o conceito. E esse é o assunto que nos interessa aqui, fechando um ano de grande e profundas mudanças como está sendo 2020.
O foco dos autores são as corporações nos negócios do século XXI, através da identificação e análise das tendências ‘que prometem uma mudança transformadora’. É um livro que conheço bem, talvez pela esperança que traz em si, de que as coisas possam vir a ser diferentes. Nos últimos meses tenho visto, um a um, o que eles chamam de ‘marcos de um mundo em mutação’ começando a aparecer no horizonte.
Talvez os futuristas nem sempre acertem. Talvez eles apenas criem uma expectativa que, pela força da consciência, acaba se realizando. Por exemplo, como não desejar que um dos novos gurus da futurologia, o holandês Christian Kromme, se prove certo ao dizer que a próxima onda tecnológica vai priorizar o coletivo e valorizar qualidades intrinsecamente humanas?
Maynard e Mehrtens começam afirmando que
“Para enfrentar os desafios apresentados por um mundo que se transforma num ritmo cada vez mais rápido, temos de abandonar valores, crenças e práticas que se tornaram ou logo se tornarão anacrônicos, e formular outros, que sejam compatíveis com as novas circunstâncias.”
De fato, a pandemia do Covid19 está mexendo com nossas entranhas; nos fazendo rever conceitos antes intocáveis; rever posições e traços culturais que, apesar de duvidosos, definiram comportamentos de gerações; olhar para a maneira como temos levado nossas vidas individualmente e em sociedade.
Não é, e não será diferente com as corporações, que embora sejam consideradas como a instituição mais forte de nossa sociedade, conduzindo o mundo através dos negócios, têm a plena consciência de que servem à sociedade.
Absolutamente saudável!
Marcos de um Mundo em Mutação
Para os autores, que não só analisaram dezenas de estudos de autores de diversas áreas, e discutiram com outros tantos, alguns sinais antecedem e prenunciam as mudanças para a Quarta Onda. Sete sinais, na verdade:
- Mudança de Consciência. Cada vez mais as pessoas percebem a si mesmas como criadoras ativas na criação de sua própria realidade e confiam na sabedoria interior buscando caminhos de crescimento individual e consciente.
- Desencanto pelo Cienticismo. Se até há pouco tempo tudo era reduzido a descrições matemáticas de fenômenos físicos e químicos, o conhecimento absolutamente racional, hoje já se sabe, com o estudo da física quântica, que processos não racionais são importantes na busca e na compreensão dos conhecimentos.
- Fontes interiores de autoridade e poder. Encontrar e reconhecer o ‘conhecimento inconsciente’ expresso na intuição, criatividade e inspiração tem sido refletido no desejo de viver de modo a manifestar a plena capacidade.
- Reespiritualização da sociedade. A busca de propósito, de um sentido para a vida, da compaixão e da unidade é uma tendência que antecede a pandemia e só tem crescido, principalmente nas novas gerações.
- Declínio do materialismo. Começa um movimento de percepção de que há algo mais além de consumir e que nosso mundo não é um grande shopping center. O consumo consciente vem acompanhado de fatores intangíveis como a convicção, realização e justiça.
- Democratização política e econômica. O imperialismo político e econômico vigente há séculos passa a ser visto como ultrapassado. A pergunta é: será dividido?
- Além da nacionalidade. O reconhecimento de que há uma interdependência entre todos e que a sobrevivência do planeta depende disso.
Ondas que coexistem
Sendo o planeta formado pela grande diversidade social, econômica e cultural, é fato que as ondas coexistem a depender do grau de desenvolvimento regional. A primeira onda, da revolução agrícola, é considerada encerrada. Mas a segunda, a terceira e agora a quarta onda, estão encadeadas de modo a uma levar diretamente à outra.
“A Segunda Onda se assenta sobre o materialismo e a supremacia do homem. A Terceira Onda manifesta preocupação com o equilíbrio e a sustentabilidade. E a Quarta Onda caminha na direção da integração de todas as dimensões da vida e na responsabilidade pelo todo.”
Voltado para o mundo corporativo, o livro apresenta quadros comparativos bastante interessantes sobre as três ondas de desenvolvimento da sociedade. As diferentes visões de mundo em relação a valores, autoridade, relacionamentos, tomada de decisão mostram um bom caminho a seguir para as organizações.
Desafio: um novo papel para os negócios
2020 mostrou que é necessário acelerar as mudanças e há a consciência global disso. Só não há ainda nenhum caminho definido, a não ser especulações, tentativas, ensaios e erros.
A realidade é difícil de lidar e não há certezas. O mundo é VUCA (volátil, incerto, complexo e ambíguo)? Não mais! A sugestão agora mudou para BANI (frágil, ansioso, não linear e incompreensível) – Stephan Grabmeier.
Se há uma certeza, ela é única: a necessidade premente da mudança corporativa.
A dimensão do papel corporativo mudou, a riqueza corporativa, também. Bem como a estrutura, o ambiente de trabalho, a tecnologia, a liderança, a economia e o próprio negócio. Como costumo dizer, não há um novo normal: há um novo mundo. E nesse novo mundo, as corporações podem atuar como administradores globais.
Futurismo? Não apenas. Tendências.
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