Quentin Tarantino é um cineasta que ama o cinema. Sua mais recente declaração de amor ao cinema foi o indicado ao Oscar, Era uma Vez em Hollywood (2019). Nele, ele homenageia a cidade berço do cinema americano, focando o roteiro no final dos anos 60, considerado historicamente com o final da Era de Ouro dos grandes Estúdios, como a MGM, que está negociando sua venda para quem fizer a melhor oferta acima dos 6 bilhões de dólares. Ironicamente em 1974, o estúdio decidiu produzir um filme documentário que resgatava seus grandes sucessos musicais, trazendo nomes como Frank Sinatra, Debbie Reynolds, Liza Minelli, Fred Astaire, Gene Kelly entre outros para apresentar vários segmentos mostrando o que foi esse grande estúdio comandado por Louis B. Meyer.
Durante várias décadas, a MGM tentou se segurar depois do final da Era de Ouro em várias pontas: investiu em produções para TV, foi para Las Vegas gerenciar um dos grandes hotéis da cidade, negociou parte do seu acervo de clássicos com a Turner no final dos anos 80, enquanto ainda produzia alguns sucessos para a telona, como a franquia Rocky – Um Lutador, os filmes de 007, além de O Hobbit, Legalmente Loira (que terá um terceiro filme), Robocop, além de uma acervo de 4 mil títulos e 17 mil horas de conteúdo em filmes e séries para a TV.
Tudo isso, infelizmente, além de decretar o fim de uma Era, começa a ser negociado através dos pesos-pesados do setor de investimentos, Morgan Stanleu e o Lion Tree LLC. Os executivos da MGM sabem que seu acervo em filmes e séries é uma mina de ouro na Guerras dos Canais Streaming, com empresas famintas por novos conteúdos para alimentar suas grades de programação. Recentemente, por exemplo, a Amazon Prime Video criou cinco novos canais dentro de seu serviço por um custo adicional, para acessar os conteúdos do Looke, Starzplay, Paramount +, o infantil Noggin, e o MGM, contendo as séries Stargate SG1 e Stargate Atlantis, dois grandes sucessos produzidos pela MGM. Hoje, a MGM tem no ar as séries The Handmaid’s Tale – O Conto da Aia no Paramount Channel e Globoplay, Fargo na Netflix, e Vikings no Fox Premium e Netflix.
Desde 2010, quando pediu concordata, a MGM foi assumida por seu principal acionista, a Anchorage Capital, sob o comando de Kevin Ulrich, que também passou a presidir o conselho dos diretores do estúdio. Esse ano, a empresa sofreu um baque assim como todo o mercado de entretenimento mundial, com a pandemia de COVID-19. Um de suas joias no cinema, o 25º filme de James Bond (Sem tempo para morrer) não chegou aos cinemas, obrigando a atrasar o lançamento previsto para o natal do ano passado para abril de 2021. E mesmo assim, ainda não se tem certeza de que o filme chegará ao cinema na data, caso seja negociado para algum canal streaming exibi-lo.
E como vem acontecendo nesse clima, os grandes estúdios têm realizado intensas negociações para não amentar ainda mais o buraco financeiro causado pela não exibição plena de suas produções nos cinemas. A Warner Bros decidiu que irá lançar seus grandes filmes simultâneos com seu canal streaming, o HBO Max. A Paramount fechou com a Amazon o lançamento de O Príncipe em Nova York 2 para março de 2021. A Apple ofereceu quase 400 milhões de dólares para lançar com exclusividade o 25º filme do agente James Bond, quinto estrelado por Daniel Craig. Só que os executivos do estúdio acharam a proposta fora da realidade já que os filmes anteriores como Spectre (2015) faturou mundialmente cerca de 880 milhões de dólares, enquanto 007 contra Skyfall arrecadou US $ 1,1 bilhão em 2012.
Aliás, qualquer negociação com a Apple tem sido tratada de forma muito delicada desde 2018, após a demissão de Gary Barber, presidente do Estúdio e fundador da Spyglass Entertainment. O motivo é que Barber teria iniciado uma grande negociação com a Apple para que a empresa de tecnologia comprasse a MGM por 6 bilhões de dólares. No meio da fumaça, Kevin Ulrich disse aos acionistas que deveriam segurar um pouco mais qualquer plano de venda do estúdio, até conseguir chegar ao valor de 8 bilhões. Mas pelo andar da carruagem, é um número que parece alto demais para o que sobrou da lendária MGM. Segundo a revista Variety, o preço de mercado da MGM hoje não passa de 5,5 bilhões.
Como um limão pode gerar uma limonada, a procura por novos conteúdos pelos canais streamings aumentou substancialmente por causa da pandemia. Afinal, que fica em casa precisa de novos conteúdos sejam eles de quaisquer fontes. Além do acervo que a MGM ainda possui, o estúdio também é dona de várias produções originais como a nova versão da antologia Quinta Dimensão e a cobiçada franquia Stargate, cujas duas primeiras séries Stargate SG1 e Stargate Atlantis, estão disponíveis no Amazon Prime Vídeo através do canal MGM.
Cobiçada por que desde que foi criada em 1997, Stargate SG1 criou uma considerável legião de fãs ao redor do planeta, sempre cobrando dos criadores da série, a volta da franquia. Stargate SG1 tem dez temporadas e dois telefilmes, enquanto que Atlantis tem cinco temporadas, e o ultimo spinoff, Stargate Universe, ficou apenas duas temporadas no ar. O mais recente projeto da franquia foi a websérie Stargate Origins, que está disponível no Amazon Prime no formato de um telefilme.
Brad Wright, um dos criadores da série original, já está em avançadas conversações para a produção de uma nova série baseado no sucesso Stargate. Outro bom motivo para o envolvimento da MGM na nova série é que a ficção-científica vem sendo um gênero muito procurado pelos assinantes dos canais streamings. Não é à toa que a Netflix trouxe para o Brasil e outros países fora Estados Unidos e Canadá, a maior parte das séries baseadas em Jornada nas Estrelas. Ela quem produziu a nova versão do clássico Perdidos no Espaço, que terá uma terceira e última temporada em 2021.
Enquanto a Disney anunciou um investimento geral de até 14 bilhões de dólares em novos conteúdos originais para o seu seu canal Disney+, sendo que a maioria dos futuros conteúdos tem a ver com adaptações dos quadrinhos da Marvel e novas séries baseadas em Star Wars. Outros canais streaming como Apple TV +, lutam para consolidar sua posição com novas aquisições ou conteúdos originais. A HBO Max, da Warner Media, quer fazer mais séries com personagens da DC Comics, enquanto que o Peacock, da NBCUniversal, aposta que Sam Esmail, criador do premiado Mr. Robot, traga uma nova versão da consagrada Battlestar Galactica. Enquanto isso, The Expanse, que tinha sido cancelada pelo SyFy americano, tornou-se um grande sucesso na Amazon.
Não se sabe ao certo se o conteúdo existente hoje no acervo da MGM será o suficiente para interessar uma grande empresa em investir cerca de seis bilhões de dólares para ter acesso a esse conteúdo. A franquia Stargate, contudo, parece ser um grande atrativo para qualquer canal streaming entrar na guerra com uma munição muito eficiente. Mas o próximo capítulo dessa novela, só deve acontecer no primeiro trimestre de 2021, quando o horizonte com a COVID-19 está um pouco mais claro.