Calma, calma, não se trata de nenhuma atividade sexual ou comercial do meu amigo Jorge Bodanzky, longe de mim tratar destes assuntos, este universo está sob o domínio de uma grande feiticeira chamada Marcia!
A questão é que na última 5a-feira estreou na HBO Mundi uma série de Jorge Bodansky e Fabiano Maciel – intitulada Transamazônica: uma estrada para o passado – cujo argumento é uma preciosidade, trata-se do olhar do Bodanzky em uma re-visita à Amazônia, especificamente à Transamazônica, lugar em que ele esteve filmando há 40 anos atrás.
Este assunto, transformou-se em seu tema predileto, a Amazônia como universo de construção da tragédia em seu mais amplo potencial e dimensão, presente, ao vivo e a cores, com a participação de milhões, isso mesmo, milhões de atores.
Pois bem, isso tudo começou na década de 70, vivíamos sob o domínio da ditadura militar, da burrice e por consequência da falta do entendimento correto das coisas. Eu presenciei e acompanhei a montagem do primeiro ato desta tragédia, era um adolescente da classe média morando no Rio de Janeiro.
A ditadura após alguns anos de sucesso como projeto econômico de desenvolvimento começava a fazer água por todos os lados, contudo, como vimos, era um navio que demoraria a naufragar.
Eu na minha confortável casa na rua Barão de Oliveira Castro no Jardim Botânico, Rio de Janeiro, me sentia incomodado, aparentemente sem nenhum motivo, afinal estava no paraíso com tudo que pudesse precisar a minha disposição. Entretanto, me sentia a quilômetros da felicidade, o ar pesado afastava qualquer possibilidade de tranquilidade e satisfação, havia sempre um fato, uma notícia ou uma desconfiança de notícia que estragava tudo.
O AI-5
Na verdade, aquele AI-5 não me afetava em nada, a menos de uma irmã que teve de seguir as pressas para a Europa, isto era um pequeno incidente, ela estava ótima morando em Paris distante das atrocidades. Mas, alguma coisa me incomodava noite e dia e nestas mesmas noites e dias assistia a decadência evidente do projeto econômico da ditadura.
Um belo dia, com toda pompa e propaganda o Governo anuncia que no dia D e na hora H seria anunciado um projeto de grande impacto que iria mudar a feição de nosso país colocando-o rapidamente ao lado de outras nações mais avançadas.
Me enchi de esperança e no dia D hora H estava eu lá ansioso diante da televisão aguardando a notícia da possível extinção do AI-5, anistia dos presos políticos ou no mínimo a convocação de eleições, medidas que realmente pudessem alterar o rumo nefasto de nossa história recente.
Enfim, chegou a hora! No horário nobre da televisão em cadeia nacional foi por fim anunciado a projeto de grande impacto!
A CONSTRUÇÃO DA TRANSAMAZONICA!
Imaginem minha decepção, esperava a queda do AI-5 e recebo a Transamazônica em troca!
A partir daí a história vai ser contada por alguém muito mais qualificado do que eu, o Bodanzky e seu documentário da HBO, acho que foi produzido pela HBO alemã, desconfio que pouca gente aqui realmente se preocupa com a Amazônia.
Para quem não sabe o Bodanzky é o diretor (acho que também roteirista, diretor de fotografia, diretor de arte, cozinheiro, motorista ……) da obra-prima IRACEMA UMA TRANSA AMAZÔNICA. Este filme é uma jóia de nosso cinema é de uma crueza e potência indescritíveis. Na verdade adota um linguajar que, acho eu, foi depois seguido com sucesso pelo Fernando Meireles em Cidade de Deus e pela magistral Sandra Kogut em Mutum e Campo Grande, uma linguagem de cinema que esses três aí são mestres.
Me desculpem se estou falando besteira na minha avaliação precária como entendido de cinema. Enfim, eu falei no início deste texto do argumento da série que achei maravilhoso, como disse, trata-se de uma visita do Bodanzky à Transamazônica 40 anos depois, uma confrontação escancarada entre o sonho e a realidade.
Bem, o primeiro capitulo, didaticamente, começa pelo começo ou seja pelo Km 0 da estrada e aí vai minha primeira surpresa! A Transamazônica começa no nordeste, exatamente, o Km 0 da 283 é no nordeste do Brasil, na cidade de Cabedelo, na Paraíba.
Até que o resultado não foi tão mal deste pedaço de estrada cruzando o nordeste, trouxe conforto e um pouco de progresso para um pedaço de nosso país acostumado com o abandono e o isolamento. Uma pena que nossos governantes não tenham percebido que se tivessem investido neste lugar e nestas pessoas o restante do dinheiro empregado na construção da estrada, seria mais simples e muita coisa poderia ter mudado.
Enfim, ali naquele deserto até que estrada trouxe um pouco de alento, era como um pouco de ar fresco!
A coisa vai se complicando na medida que a paisagem muda, quando saímos do clima agreste do nordeste e entramos no clima tropical úmido da região norte com chuvas, índios e a mata tropical. O que os militares achavam ser uma terra desocupada na verdade não era, ela estava ocupada por uma biodiversidade enorme e por seus guardiães a séculos, os índios, os povos das florestas.
Neste ponto encerra-se o primeiro episódio, exatamente quando tudo começa a complicar, estou mais ansioso do que curioso para assistir os próximos capítulos, a existência da tragédia está no noticiário diariamente, tudo isto já sabemos, o que falta é a dimensão do estrago feito e a conscientização da sociedade e neste ponto o projeto do Bodanzky será fundamental.
Não percam: HBO Mundi, sempre na quinta-feira, às 21h.
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Transamazônica: uma estrada para o passado
A construção da rodovia Transamazônica foi uma saga gigantesca, realizada nos anos 70 durante o governo militar brasileiro. A estrada que deveria promover a integração nacional acabou ficando conhecida por ligar a fome do Nordeste à miséria da Amazônia e foi abandonada no meio do caminho sem ter sido concluída. Contar a história dessa estrada, quilômetro a quilômetro, encontrando as pessoas que viveram essa experiência e confrontando-as com esse material de arquivo inusitado é o objetivo desta série documental.
PROS
- Obrigatório para quem quer revisitar uma história equivocada
CONS
- Dá tristeza revisitar uma história equivocada
Análise da Avaliação
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Direção
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Cenários