Você já deve ter ouvido, em algum momento da sua vida, um ditado muito popular que diz: “me diga com quem tu andas que eu lhe direi quem és”.
Temos uma necessidade genuína de pertencimento, começando inicialmente pelos círculos familiares e, aos poucos, ampliamos ou restringimos a nossa participação nos demais grupos.
Tudo muda o tempo todo.
Estamos numa era de mudanças frenéticas, caóticas, cheias de incertezas, complexidade e ambiguidade. Nosso processo de decisão está cada vez mais vulnerável, frágil e sem controle sobre os resultados.
Por conta de todo esse contexto, nosso pensamento crítico é sequestrado e somos facilmente alvo de manipulações em suas mais diversas formas e intensidades.
Escolhemos nossas bolhas sociais conforme a reciprocidade de pensamentos e comportamentos, aceitando, sem resistência ou critério, ideias rasas como verdades absolutas. De acordo com falta de atitude e o menor esforço, delegamos aos outros a liberdade de escolha que nos cabe. Dá muito trabalho pensar, decidir, não é mesmo?
Eu não sei.
É preciso reconhecer e transparecer quando não sabemos, ou não temos uma opinião formada sobre determinado assunto. Raul Seixas, cantor, compositor e produtor musical, em sua célebre canção “Metamorfose ambulante“, na década de 70, já compartilhava um jeito de ser mais flexível e descomplicado do que temos atualmente, na era de redes sociais:
“Eu quero dizer
Agora o oposto do que eu disse antes
Eu prefiro ser
Essa metamorfose ambulante
Do que ter aquela velha opinião
Formada sobre tudo, (…)”
Todavia, em nossa sociedade o não saber, a ignorância, mudar de opinião são vistos como um defeito, um desvio cultural, objeto de vergonha e julgamento. Há quem defenda suas “opiniões de estimação” para evitar o constrangimento de admitir a falta de conhecimento suficiente e expor sua opinião sobre determinado assunto.
Dados x Conhecimento
Diante de tamanha insegurança social, nos dispomos a incorporar qualquer verdade ou conceito para não deixar que os outros nos percebam como seres menos inteligentes, excluindo nossa presença no grupo. Assim, partimos para a defesa de conceitos e posturas que, no fundo muitas vezes, não refletem a nossa própria verdade.
O efeito manada vai nos condicionando a sermos todos iguais, com os mesmos comportamentos e necessidades. Não é de se estranhar que numa sociedade com tanto acesso à informação, também seja a mais desinformada.
O binômio dados e conhecimento não tem diferença no seu significado. Não aprofundamos o nosso repertório, muitos se tornam especialistas do seu próprio umbigo, procurando na internet apenas informações que reafirmam sua consagrada posição.
Conformidade e preconceito
Os desafetos são conquistados em lotes, quando encontram em seu meio pessoas com outros pontos de vista, rejeitando a inovação e a oxigenação das ideias. O importante é convencer e não conviver com quem é diferente de mim.
A intolerância faz as suas vítimas, vemos o aumento estarrecedor de feminicídios, mortes por motivos banais, violência racial, animosidade contra diversos grupos que lutam pela sua representatividade como: LGBTQ+, idosos e pessoas com limitações permanentes, que as deixam em situação de vulnerabilidade.
Na busca pela conformidade, busca-se uma validação pelo outro. A falta de segurança social expõe que não somos o quê pensamos ser, somos o que fazemos e por isso, o outro nos percebe, servindo de espelho para enxergarmos nossas virtudes e desafios.
Nosso cérebro repete modelos, mas a nossa necessidade muda a todo instante. O efeito manada é a prática do poder pela maioria, da alienação frente a conscientização. O medo da exclusão, do diferente, vai condenando toda sociedade à estagnação e ao retrocesso.
Conviver com a dúvida
Podemos pensar que há opções mais saudáveis e conscientes que consigam conviver com a dúvida, assim conquistamos um espaço para questionar, aprender, abertos ao exercício da curiosidade e não do julgamento sumário.
Acredito que, ao respeitarmos o nosso mundo plural, participamos de uma sociedade muito mais inclusiva, permitindo que verdades absolutas sejam avaliadas, melhorando os argumentos que nos assistem, agindo com empatia, percebendo outras vivências.
Mudar já deixou de ser opção, mas ter consciência de que você é capaz de fazer as próprias escolhas, pode fazê-lo se reconectar com sua verdadeira potência para a ação, no lugar de depender da validação dos outros e paralisar a sua trajetória.
** É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita. O Jornal 140 não se responsabiliza pela opinião dos autores deste coletivo.