Conversei com Bianca Sonnewend, profissional de marketing e facilitadora de comunicação não-violenta:
Você pode contar um pouco da sua trajetória?
Tenho 23 anos, há 06 atuo na área de marketing, na qual sou formada. Já trabalhei em agências e startups, cenários envoltos em competição e comunicação um tanto violenta, que pediam “sangue nos olhos e faca nos dentes”…
Eu notava que era uma pessoa no trabalho e outra na vida pessoal, estava com dificuldades de achar um meio termo. Foi estudando impacto social e ambiental que comecei a entender que existe uma forma de ganhar dinheiro e ao mesmo tempo mudar o mundo. E aí começou uma transformação que me levou a pensar sobre comunicação não-violenta e empatia. Fiquei com uma pulga atrás da orelha: “como se conectar com as pessoas? Como ter essa empatia?”.
No fim de 2019, cheguei em um segundo burnout e tive a certeza de que precisava fazer algo, chegar a um local de conexão com os outros – o que sempre foi importante na minha vida, mas na profissional, me afastava. Então, decidi me aprofundar em CNV (comunicação não-violenta). Hoje, por meio do Instagram @aprendizdegirafa, trago ao público conteúdos de seu universo.
Como você define a comunicação não-violenta?
Gosto de pensar que é uma forma de se relacionar com o mundo. Aplicá-la é como trocar os óculos que não estão funcionando por um novo par, que deixa tudo mais claro. Não é como se a CNV deixasse as coisas mais fáceis, mas sim clareasse caminhos para resolução de conflitos. Com ela, nos tornamos capazes de ver o mundo de uma forma diferente, conseguimos nos conectar com o outro – e não na zona do julgamento, da crítica ou autopromoção, mas na de real conexão, na qual entendemos que a pessoa precisa de algo e tem emoções diferentes quando em privação.
As palavras centrais para pensar na CNV são sentimento e necessidade. Ela nos enraíza em volta da compaixão, nos faz entender o que temos para dar ao outro. Ela vem como ato de comunicação externa, mas também é para dentro. Procura curar autojulgamentos e liberar espaços para entender a realidade alheia. Penso na analogia do avião: quando cai a máscara de oxigênio, primeiro colocamos a nossa, depois ajudamos terceiros. Então, como vou dar empatia e amor se não os tenho a mim?
Você vê a valorização de habilidades como estas?
Sim. Pesquisas do Fórum Econômico Mundial mostram que as habilidades do futuro são colaboração, trabalho em grupo, empatia, comunicação e liderança. Como conseguiríamos colaborar com o outro se não o ouvir? Como ter empatia se só olhamos para nossa bolha? Como liderar se só pensarmos em si?
Essas soft skills resumem um momento de transição, em que urge uma forma diferente de se relacionar com as pessoas, além do ponto de vista individualista, egocêntrico e extremo do capitalismo. É um mundo em que vemos mais colaboração, sentimento de comunidade e responsabilidade social.
Onde a CNV pode ser aplicada?
Na vida pessoal, laboral e nos tribunais – alinhada à justiça restaurativa, tem temática de resolução de conflitos.
Vejo que a CNV é mais incentivada em ambientes de trabalho colaborativos. Algumas empresas têm receio de entrar em seus temas pois contêm sentimento, individualidade e desejo de mudança estrutural – às vezes, a Instituição está pautada em escassez ou em uma relação de perde-ganha com o consumidor. A CNV traz o paradigma de ganha-ganha: benefício para a empresa e também para o cliente.
Você tem alguma ilustração da CNV na vida pessoal?
A comunicação não-violenta nos ensina a importância de levar as coisas de forma leve. Kristen Kristensen exemplifica isso ao dizer que pratica CNV há 25 anos e ainda está aprendendo. Então, não entremos em estados robotizados com fórmulas prontas. Aplicar a da CNV, “obervação – sentimento – necessidade – pedido”, automaticamente, em qualquer situação, diverge da ideia de conexão, de empatizar com o outro e consigo.
Nos exemplos cotidianos, podemos pensar em qualquer relação. Aprendemos a enxergar os parceiros como pessoas separadas de nós. É possível acharmos que companheiros devem fazer o que queremos, caso contrário, não são as “companhias certas”. A CNV parte de outro princípio, de que você é a única pessoa responsável por atender as suas necessidades, apesar de poder ser ajudado.
No mais, ela vem para te questionar o que é certo e o porquê de você assim o considerar. Por que já vamos com pompas para dizer que o outro é errado? Conflitos surgem quando temos uma estratégia que consideramos correta e outrem possui uma distinta da nossa, e assim não conseguimos chegar em um ganha-ganha. Se percebemos o que está por trás e o que queremos aprender, podemos achar um terceiro método.
Você tem dicas para alguém que quer conhecer esse universo?
Indico os livros do Marshall Rosemberg. “A Linguagem da Paz em um Mundo de Conflitos” pode ser um bom começo.
De documentários, gosto muito de Human, disponível no YouTube. Ele traz histórias de pessoas do mundo inteiro, de vários contextos; faz você se sentir humano ao ver tudo aquilo e perceber que várias coisas de que aquelas pessoas precisam são também necessárias para você. Também recomendo The Mask You Live In, que aborda os malefícios do machismo para os meninos e seus processos de crescimento.
Adoro o Ted da Brene Brown, que fala que a vulnerabilidade é algo que nos conecta.
Outra coisa que faz sentido para mim é a meditação e o mindfulness, a estratégia de estar vivo no aqui e no agora.
Enfim, cursos podem ser interessantes, alguns oferecem bolsas. Tem os do Instituto CNV Brasil, do Instituto Tiê… logo oferecerei o meu!
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