Números desastrosos, prazos prorrogados e ações inexplicáveis. São estas e algumas outras ações do governo brasileiro que têm dado o tom sobre como estamos tratando a pandemia da Covid-19. Temos visto que muitas delas acabam sendo usadas muito mais como arma política do que efetivamente instrumentos de resolução ou ajustes visando o bem da população. E, mais um ato que acabamos não tendo certeza da finalidade é a CPI da Covid que já vem mostrando movimentos desde a segunda semana de abril.
Para começarmos do início. Uma CPI é um dispositivo de prerrogativa do Poder Legislativo e pode ser criada pelo Senado, pela Câmara dos Deputados ou pelas duas casas em conjunto. A Constituição Federal estabelece que para que uma CPI possa funcionar, ela deve cumprir três requisitos: i) ela deve contar com 1/3 da assinatura dos parlamentares (este número depende em qual Casa ela é iniciada, se no Senado ou na Câmara dos Deputados), ii) é preciso que haja um fato a ser investigado, e iii) ela deve ter um tempo determinado de funcionamento.
No caso da CPI da Covid, essa – que contou também com uma pressão do STF – foi iniciada no Senado, e contou com a assinatura de mais de 1/3 dos senadores; eram necessárias 27 assinaturas e foram conseguidas 32. O fato a ser investigado – que causou bastante movimentação durante este mês – será a conduta do governo federal no enfrentamento da pandemia. Alguns parlamentares queriam que a investigação também se estendesse aos estados e municípios, entretanto, a investigação dos estados não é matéria que pode ser incluída em uma CPI já que não pode haver invasão da competência das Assembleias Legislativas locais, por isso o que será investigado com relação a estados e municípios é o repasse de verbas federais a estes na área da saúde. E o prazo para que esta CPI transcorra, é de 90 dias.
Uma CPI é tida como um instrumento da “minoria parlamentar” e isso se deve pelo primeiro ponto colocado acima (a necessidade de 1/3 das assinaturas), o que abre precedentes para que oposições menores consigam abrir uma Comissão de Inquérito. E quando ela é aberta, a mesa diretora deve instalá-la, uma vez que não pode ferir o direito subjetivo das minorias; isto é posto pelo Mandado de Segurança nº 24.831/ DF decidido pelo STF. No caso da CPI da Covid, o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, não via o instrumento como apropriado para o momento e entendia que ela não traria soluções para a negligência do governo, apenas traria mais atenção para a corrida político-eleitoral de 2022. Entretanto, pelo Mandado de Segurança, a pressão do STF se fez e Pacheco teve de instalar a CPI.
A saber, e considerando o segundo requisito para que uma CPI seja instalada, serão investigados: o tratamento precoce da Covid-19 com a produção e distribuição de cloroquina, a crise do oxigênio no país, sobretudo em Manaus, estratégia de comunicação de governo durante a pandemia, falta de testes, fechamento de UTIs, atraso na compra de vacinas e a falta de medicamentos do kit intubação.
A primeira reunião da CPI acontecerá no dia 27 de abril (de forma semipresencial) e o senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), cotado como possível vice-presidente da comissão já construiu um roteiro em que consta mais de 60 requisições de documentos e mais de 15 temas. Vale lembrar também que a composição da CPI conta com maioria opositora ou “independente” ao Presidente da República, Jair Bolsonaro: possivelmente Omar Aziz (PSD-AM) como presidente e Renan Calheiros (MDB -AL) como relator.
Imagem da matéria do G1 do dia 14/04/2021
Ao presidente da Comissão fica a responsabilidade de ditar os rumos das investigações e definir as autoridades convocadas a prestar esclarecimentos. Possivelmente os membros e ex-membros do governo a serem ouvidos são: ministro da Economia, Paulo Guedes, sobre o auxílio emergencial, o ex-secretário de Comunicação da Presidência, Fábio Wajngarten; o secretário especial da Secretaria de Assuntos Estratégicos, Flávio Rocha; o secretário do Tesouro Nacional, Bruno Funchal; e o ex-comandante do Exército, Edson Pujol, ex-ministros da Saúde Luiz Henrique Mandetta, Nelson Teich e Eduardo Pazuello, além de ex-secretários Antonio Elcio Franco, Mayra Pinheiro e Airton Cascavel, e o atual ministro, Marcelo Queiroga. Ao relator cabe a apresentação de conclusões da CPI que são encaminhados à Mesa Diretora, neste caso do Senado, que, na sequência, pode encaminhar o relato final ao Ministério Público para que este dê o encaminhamento criminal e civil aos infratores. Fora a forte oposição na Comissão de Inquérito, o presidente da República já havia entrado em confronto com o Ministro do STF, Luis Roberto Barroso quando este mandou que o Senado instalasse a CPI.
São muitos os envolvidos e muitos temas a serem esclarecidos e, ouso dizer, em pouco tempo. Poderíamos enumerar motivos para que essa CPI fosse instalada, da mesma forma que poderíamos enumerar motivos para que ela não fosse. O que se sabe é que toda e qualquer Comissão Parlamentar de Inquérito é um instrumento de fiscalização do Executivo de prerrogativa do Legislativo e que – a rigor – visa o interesse público e assim sendo não deve (ou não deveria) ser usada como arma política. Ainda, se espera lisura no processo, mesmo que tudo atrelado à pandemia tenha sido politizado. Tenhamos esperança! E vejamos os próximos capítulos!
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