Em uma guerra, a verdade é sempre a primeira vítima. A guerra da Ucrânia confirma cabalmente esta afirmação embora a mídia digital tenha trazido uma nova perspectiva. O Jornal 140, que foi criado por mim e pelo Rafael Sartori (acrescido de novas/novos colaboradores nos últimos três anos), para entender o impacto da digitalização no mundo, reuniu alguns dados que pode contribuir para que os leitores consigam acompanhar o assunto com mais propriedade.
Sou leitor e consumidor de notícias voraz. Nos anos 90, tive a pachorra de assinar o jornal The New York Times. Quanta ignorância! Recebia-o em pacotes enormes com 10, 20 exemplares, um mês depois. E eis que estamos no século XXI, em 2022. Agora assino a versão digital do The New York Times e acompanho os muitos equívocos e alguns acertos deste grande jornal.
O jornal tem feito uma cobertura bastante extensa, com vários corrrespondentes e, claro, abertamente pró-Ucrânia e anti-Rússia. Chama a atenção a chamada da home: abriu um canal de informação para Andriy Yermak, chefe do gabinete presidencial do presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky, que se transformou no herói do planeta – sua história de ator histrião à líder de um povo é de chorar. O título do artigo, publicado como “Opinião”, é antológico: “Escrevo no bunker ao lado do presidente Zelensky. Nós lutaremos até o último suspiro” (I´am writing from a bunker with presidente Zelensky. We will fight to the last breath).
Antes que alguém me questione: também estou ao lado da Ucrânia. Acho que Zelensky e a Ucrânia tem apoio de praticamente o mundo todo. A história deles, de patriotismo e de defesa da honra, contaminou a todos. Os russos inventaram uma desculpa esfarrapada – “combater os nazi-fascistas” em um país cujo presidente é judeu. Os ucranianos estão dando uma lição de relações públicas.
A razão dos russos
Procuro entender a razão dos russos, de seu presidente-ditador Vladimir Putin. Em um vídeo que circula em um grupo de WhatsApp, Putin lembra que a Rússia ficou pequena em 1991 quando a URSS se desmantelou, ficando com menos de 150 milhões de habitantes. Nos anos seguintes, o ocidente, puxado pela OTAN (leia-se EUA), avançou em várias bordas da Rússia, chegando a instalar bases militares em antigos aliados como Albânia, Bulgária, Estônia, Eslovênia, Hungria, Letônia, Lituânia, Macedônia do Norte, República Tcheca e Romênia. Putin, com razão, se pergunta: será que os EUA deixariam que a gente instalasse bases e tivesse mísseis nucleares no Canadá e México?
Os EUA bombardearam e invadiram diversos países como o Panamá, Iraque e Afeganistão. Sempre por causa de algum motivo. Sou pró-EUA. Admiro a democracia e a cultura americana. Prefiro eles ao meu lado do que os comunistas e radicais islâmicos, que matam, prendem dissidentes e eventualmente maltratam mulheres, gays e minorias. Mas os fatos mostram que no Iraque, o presidente George W. Bush, e seus assessores como Donald Rumsfeld, mentiram de cara lavada que o Iraque mantinha armas secretas. Todos nós caímos nesta esparrela.
Voltando para a mídia. O Jornal 140 já publicou uma análise da Ana Beatriz França sobre agressão russa à Ucrânia na semana passada e a nova ordem mundial em cheque, aqui. O TikTok traz centenas de vídeos, alguns ótimos, outros péssimos (que fazem brincadeira da situação) tudo muito desarticulado e zero de curadoria, o Facebook reúne muitos depoimentos de ucranianos. Acompanho também , via hahstags, os posts e vídeos no Instagram. O bom das redes sociais são os testemunhos e vídeos caseiros, mas não têm análise ou curadoria, até porque esta não é a proposta das redes sociais mesmo, embora se encontrem muitos ótimos comentários no Twitter, a rede social dos jornalistas.
O Ukrinform é a plataforma de multimídia da Ucrânia. Traz muitas informações, fotos e vídeos. Acabei de assistir ao vídeo da chegada dos negociadores da delegação ucraniana ao encontro dos negociadores russos. Antes de assisti-lo, fiquei me perguntando: será que eles se cumprimentam antes de se sentarem à mesa para negociar? Aliás fico sabendo, por este mesmo site e também pelo site da agência russa (abaixo), que são três as premissas da negociação, por parte do presidente Zelensky: 1) Cessar fogo imediato, 2) Armistício e 3) Abertura de um corredor humanitário para que haja condições de saída do país enquanto perdurarem os conflitos [atualização: apenas o item 3 foi considerado nas negociações de hoje, infelizmente]. A foto do presidente Zelensky publicada neste post (na visita, antes da guerra, ao Centro Memorial do Holocausto de Babi Yar) é da Ukrinform. Tentei encontrar um lugar para comprar a foto, mas não encontrei informações se a foto está à venda, ou que tenha direitos autorais.
Neo-nazistas … ahhnnnn?
Pelo lado russo, venho acompanhando as notícias pelo site da agência russa Interfax. Na home, o seguinte anúncio: “prezados leitores e assinantes: em virtude da crise Ucrânia-Rússia e aos extraordinários acontecimentos na Europa, a Interfax resolveu liberar acesso total às notícias em inglês, assim você pode ficar recebendo todas as atualizações”. Quer mais mídia da Rússia? Tem o Pravda News, que se abastece também da Interfax, embora também tenha produção original.
Traz números sobre baixas de ambos os lados (que evidentemente não batem com as divulgadas pelo site da Ukrinform), declarações do Putin (“nosso obetivo é desmilitarização e neutralidade de status da Ucrânia” … “estamos lutando contra neo-nazistas” … “soldados russos demonstraram heroísmo na Ucrânia” … “russos e ucranianos são um só povo”), de Lavrov (“a solução para a Ucrânia será achada … mas os ucranianos encontram desculpas e atrasam as conversações”), de Serguei Naryshkin (“o ocidente quer destruir a Rússia” … a “Ucrânia está trabalhando para criar um artefato nuclear”), sobre a ajuda internacional a Ucrânia (Ukranina Bank International estima receber ajuda de até 15 bilhões de dólares), da ministra das Relações Exteriores Maria Zakharova (“Moscou espera um acordo de paz como resultado das negociações no solo de Belarus”) e até mesmo de Zelensky (“promete apoiar pensionistas e desempregados”).
Fico tamborilando também entre Al Jazeera News, The Jerusalem Post, CNN … e, claro, a mídia brasileira como a Globo News, muito em cima de comentaristas e da Folha.com. Alguma outra dica de fonte?
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